Desde sua eleição, em outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem feito declarações temerárias sobre assuntos econômicos. Foi assim com a defesa dos aumentos dos gastos do governo sem apresentar contrapartida que garanta o equilíbrio fiscal, com os ataques ao mercado e mais recentemente contra a taxa de juros e a autonomia do Banco Central. Na última segunda, dia 27, o presidente tomou uma decisão que, se não dirimiu os equívocos anteriores, pelo menos sinalizou algum compromisso com a preservação das contas públicas. Ao reverter a desoneração dos combustíveis decretada por seu antecessor, Jair Bolsonaro, em uma medida eleitoreira tomada em junho do ano passado, ele fechou uma torneira que prometia sangrar os cofres públicos em cerca de 50 bilhões de reais apenas neste ano, isso em um momento em que o governo se esfalfa para manter o equilíbrio das contas.
Com a medida, Lula realizou um importante gesto. Pela primeira vez, o presidente empenhou apoio ao seu ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que desde dezembro defendia o fim da desoneração. Desde o princípio, Haddad vem se firmando como a voz da temperança e tem se esforçado para contrapor argumentos ajuizados às imprudências do chefe. Nessa defesa do bom senso e dos fundamentos econômicos, tem enfrentado a cantilena populista de outras lideranças petistas adeptas do discurso irresponsável pró-gastança, vocalizado principalmente pela presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e, de forma mais sutil, pelo presidente do BNDES, Aloizio Mercadante. Numa disputa que tinha o potencial de colocar sob risco a credibilidade econômica do governo, já no início do mandato, Haddad — ainda bem — saiu vencedor.
Em economias funcionais, evidentemente, o cenário ideal é aquele de impostos mínimos e redução tributária. No caso da volta dos tributos sobre a gasolina e o álcool há, no entanto, algumas nuances a ser levadas em conta. Em primeiro lugar, é importante destacar que os impostos já existiam e foram suspensos em meio ao frenesi perdulário da etapa final da administração Bolsonaro, com vistas a anabolizar sua popularidade e conquistar a reeleição. O prazo de vigência dos descontos ia até 31 de dezembro e foi estendido por dois meses — contra a vontade de Haddad e por pressão da ala política do PT. Em meio a uma cruzada pela redução do aquecimento global, os combustíveis fósseis estão na linha de tiro de entidades como o G20 e a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que defendem o fim de subsídios e o aumento dos impostos sobre esses produtos como forma de diminuir seu uso e ajudar a custear modelos de transição mais limpos. Com seu posicionamento nesta semana, o governo foi muito além de deixar a gasolina e o álcool mais caros. Analisada por um ângulo mais profundo, cravou-se aí a primeira vitória em nome da responsabilidade fiscal e do equilíbrio nas contas públicas.
Publicado em VEJA de 8 de março de 2023, edição nº 2831